segunda-feira, 13 de abril de 2009

Um olhar pela minha cidade.

Com cerca de 24km2, a Amadora é um dos concelhos mais pequenos do país, sendo toda a sua área, considerada urbana. Como cidade é um fenómeno recente, de 25 anos. Anteriormente, a Freguesia da Amadora, pertencente ao concelho de Oeiras (em épocas mais recuadas a região fez parte dos concelhos de Lisboa, de Belém e de Sintra), era a maior (em termos populacionais) Freguesia da Europa. Hoje, no panorama das cidades portuguesas, a Amadora pertence ao grupo das terceiras em número de habitantes (logo a seguir a Lisboa e ao Porto). Dispõe, actualmente, de dois parques industriais, um, o da Venda Nova, constitui-se a partir da década de 40 (com empresas como, a Sorefame, a Bertrand ou os Laboratórios Vitória), o outro, de formação mais recente, sobretudo a partir dos anos 80, é na Venteira (com empresas como a Siemens, a Canon, etc.). Tem um comércio bastante diversificado, tanto o tradicional como ao nível das grandes superfícies. Começa a estar razoavelmente bem estruturada ao nível dos serviços, salientando-se uma rede escolar bastante vasta, embora ainda carente, em especial no pré-escolar e superior. Apesar de tudo isto, a Amadora é uma cidade condicionada pela proximidade de Lisboa, sendo a sua história considerada transversal em relação à história da Capital. Chega-se a referir a Amadora como a “cidade sem história”. Contudo a Amadora (como, aliás, qualquer outra localidade) tem uma história rica, estruturante do seu próprio presente.Durante a Pré-história, a região da Amadora foi bastante habitada, mais intensamente em alguns períodos, como no Paleolítico Médio, Calcolítico e Idade do Bronze, embora existam materiais de praticamente todas as épocas, com excepção do Mesolítico e Neolítico Inicial. Com a Idade do Ferro iniciam-se contactos com o Mediterrâneo, o que é atestado por materiais púnicos e de Roma Republicana. Não é de estranhar que a ocupação romana tenha sido uma realidade. Nascerá nessa época a sua ligação a Olisipo/Lisboa, tornando-se esta região num alfobre agrícola, para a urbe da foz do Tejo.Da época islâmica e medieval, na realidade pouco sabemos, mas isso não é de espantar, tendo em conta uma economia de subsistência ou de pequeno comércio, poucos são os documentos escritos existentes, embora valha a verdade que ainda muito trabalho de heurística falte fazer. Mas aqui a toponímia pode-nos ajudar – Alfragide, Alfornel, por exemplo, ou Casal do Castelo, Alto da Cabreira, Moinho do Castelinho, são topónimos que nos remetem para esses horizontes. Zona saloia por excelência, podemos imaginar courelas bem tratadas, hortas com seus poços e cegonhas, searas de trigo doirado, ou centeio ou cevada…Já no Antigo Regime aparecem as primeiras indicações de uma forte centralidade, marcada eventualmente pela posição estratégica ao nível das comunicações na Península de Lisboa, implicando sobretudo três povoações. A mais conhecida, na época, era a Porcalhota, aldeia tipicamente saloia, referida por Eça de Queiroz, n’Os Maias, devido ao famoso coelho guisado de Pedro Franco – o “Pedro dos Coelhos”. Outra das razões desta fama é que aqui se separavam as Estradas Reais de Lisboa-Sintra e de Lisboa-Mafra. A norte da Porcalhota, situava-se uma mais pequena aldeia, a Falagueira (ou Falagueiras), que é objecto do documento escrito mais antigo, que se conhece, sobre a Amadora – aqui haveria, no século XIII, uma granja da Ordem Militar do Hospital. Finalmente, para Oeste destas duas aldeias, no alto de um monte, estava o lugar da Venteira, já próximo do Palácio de Queluz.Já com o Liberalismo e como resultado da política da Regeneração, em 1887, um acontecimento revelou-se marcante para toda a história recente da Amadora – inaugurou-se a linha de Caminho de Ferro de Sintra, com uma estação equidistante das três referidas povoações. A estação recebe, nessa altura, o nome da povoação mais populosa – a Porcalhota. Em 1895, instala-se na vizinhança da estação uma fábrica de espartilhos a Vapor, fundada por um comerciante lisboeta, que, entretanto vem viver para a Amadora – José dos Santos Mattos. Era o início de uma relação privilegiada, entre a mão-de-obra da região e a facilidade de transporte através do caminho-de-ferro, de matérias-primas e produtos transformados.Outro fenómeno está, nesta altura, a acontecer em Portugal, que irá contribuir para a transformação desta região. Está a haver uma mudança de mentalidade na burguesia portuguesa, mudança essa já ocorrida noutros países há muito tempo. O objectivo dos burgueses (de alguns, pelo menos) deixou de ser a aproximação à nobreza (ordem social, por natureza, de ostentação de riqueza), para se afirmarem como uma classe de reprodução de riqueza (dentro do quadro do Capitalismo Industrial e Financeiro, exposto a partir da Revolução Industrial, iniciada em finais do século XVIII, em Inglaterra). Essa viragem de uma parte da nossa burguesia implicou, mesmo, uma recusa dos locais de veraneio tradicionais do “jet-set” oitocentista. Os finais do século XIX são assim marcados, na Amadora, pela construção de várias casas de campo de uma burguesia jovem, sobretudo, bastante intelectualizada. Muitos deles acabarão mesmo por aqui constituir residência, em inícios do século XX, contribuindo para o desenvolvimento da zona. Em 1907, numa fase em que as três povoações cada vez estavam mais próximas, a Amadora, nome de uma quinta local, passa a designar toda a região, pondo-se de lado o velho topónimo da Porcalhota, considerado, pelos habitantes, pouco digno.Os anos que se seguem são de grande desenvolvimento para a Amadora. A fundação da “Liga de Melhoramentos”, os “Recreios Artísticos”, as `”Festas da Árvore”, a criação da Freguesia da Amadora, a instalação do “Grupo de Esquadrilhas de Aviação Republica” e construção do respectivo aeródromo, a inauguração do Parque “Delfim Guimarães”, são marcos de uma evolução urbana de grande qualidade, com equipamentos muitas vezes inovadores, relativamente ao resto do país.Esta evolução mantém-se até cerca da década de 40. É precisamente nessa fase que é criado o primeiro parque industrial. A partir daqui há uma viragem sociológica e económica (e mesmo psicológica) na Amadora. O êxodo rural que se iniciava e a necessidade de mão-de-obra para as indústrias recentes, tanto amadorenses como lisboetas, implicam um forte crescimento e, logicamente, uma pressão urbanística, que provocará uma mudança da imagem urbana.A partir dos anos 50, começa a construção da imagem da actual Amadora. Intensifica-se um forte êxodo rural e a Amadora transforma-se, pouco a pouco, num dormitório, com uma população flutuante que não permitirá a manutenção de um sentido de vila. É a época em que se inicia a construção da Damaia e em que aparecem as primeiras casas clandestinas na Brandoa. Os anos 60 e 70 acentuam esta situação, cada vez haverá uma maior desclassificação aparecem os primeiros bairros degradados, é a Amadora suburbana. Sem qualquer urbanidade, longe já iam os tempos da Amadora rural e burguesa do início do século XX, em que habitar na Amadora era um prazer. A Amadora é cidade desde 1979, por pressão populacional. Desde essa altura cresceu ainda mais, mas, paulatinamente, recriou vida interna, recriou espaços de lazer e de trabalho. O terciário, sobretudo, cresceu a um ritmo bastante elevado. A pouco e pouco a Amadora foi-se requalificando, pese embora muito ainda falte fazer. Entretanto, passa a ser parte integrante de uma conurbação (junta-se fisicamente às cidades de Lisboa e Queluz), constituindo-se num dos pontos fulcrais da comunicação entre várias frentes urbanas.
Venteira, 31 de Outubro de 2004

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